E como entendi que fazer as pessoas ficarem é mais transformador do que fazê-las chegar.

Quando percebi que a experiência sustentava mais do que a promessa, minha escrita mudou de função.
Em 2013, comecei oficialmente a trabalhar com conteúdo. Mas, se for contar desde quando escrevo com intenção de encantar ou entreter, o marco é bem anterior: 2008.
Antes de métricas, estratégias ou segmentações, existia o desejo de conectar. Escrever para criar vínculos, provocar emoções, informar e, principalmente, contar boas histórias.
Foi isso que me levou ao marketing.
E foi isso que, anos depois, também me fez sair dele.
O marketing que me formou
Durante muitos anos, passei por agências, startups, empresas de médio e grande porte. Fui estagiária de design e conteúdo, social media, CRM, analista de comunicação e depois analista de conteúdo.
Era a clássica trajetória de quem domina a comunicação digital: planejamentos, copys, newsletters, posts, ações sazonais, relatórios, campanhas com e sem verba. E eu gostava.
Gostava de entender o comportamento das pessoas e usar isso para criar mensagens cada vez melhores, que convertiam mais. Gostava da adrenalina das entregas e da sensação de ver um e-mail com alta taxa de abertura ou uma campanha viralizando.
Mas algo começou a me incomodar.
De convencer a cuidar
O incômodo veio quando percebi que muito do meu trabalho era voltado a convencer:
- Convencer alguém a clicar.Convencer alguém a comprar.Convencer a se cadastrar.Convencer a dar atenção.
Comecei a me perguntar: e depois que clicam? Depois que compram? A promessa que fiz se sustenta na experiência real? O conteúdo que usei para atrair está alinhado com o que acontece no produto? Ou a pessoa vai se decepcionar, se perder, cancelar, sair?
Foi quando, em 2018, conheci o UX Writing. Ainda de forma um pouco tímida, o termo já circulava entre designers, desenvolvedores e comunicadores inquietos como eu. E, assim que entendi do que se tratava, senti aquele estalo que a gente tem quando encontra algo que faz sentido.
UX Writing não era “escrever melhor para produtos”. Era pensar em conteúdo como parte da experiência, como infraestrutura, como design. Era transformar palavras em pontos de contato claros, acolhedores, úteis.
Era comunicação, sim, mas com um propósito menos invasivo e mais colaborativo.
Era cuidar, ajudar, e não convencer.
A transição: entre o entusiasmo e o estranhamento
Em 2019, já como analista de conteúdo sênior, comecei a integrar práticas de UX Writing no dia a dia. Participei de sprints de produto, redesenhei fluxos com designers, revisei microcopy de telas, protótipos, push notifications, onboarding e mais.
Fiz pesquisas com usuários para entender como se sentiam com determinadas palavras. Questionei mensagens de erro que culpavam o usuário. Propus guidelines mais inclusivos.
Mas fazer isso ainda como “analista de conteúdo” exigia justificar constantemente meu papel.
E mesmo que meu dia inteiro fosse focado na escrita para o produto e não mais para a venda estrita dele, foi só em 2022 que assumi exclusivamente cargos de UX Writer e Content Designer.
Desde então, dedico minha carreira a pensar conteúdo na lógica da experiência. Pesquisa, estratégia, sistemas, acessibilidade, consistência e, principalmente, empatia. A escrita como arquitetura de navegação, compreensão e, claro, cuidado.
UX Writing não é “copy bonita” ou “copy de botão”
Migrar do marketing para o UX Writing exige entender que, apesar de haver interseções, são disciplinas com fundamentos, objetivos e formas de medir impacto diferentes.
Enquanto o marketing foca em atrair e converter, o UX Writing foca em guiar, sustentar, engajar e manter.
Um usa o conteúdo como ponte. O outro, como estrutura.
Não se trata de uma evolução linear, mas de um redirecionamento. Trocar o “olha pra mim” pelo “como posso te ajudar?” e a voz da marca pelo diálogo com o usuário. Trocar metas de awareness por métricas de task success, retention, NPS, compreensão.
E isso muda tudo.
Muda o briefing.
Muda a equipe com quem você trabalha.
Muda o ciclo de vida do conteúdo.
Muda a sua relação com o impacto que causa.
Sobre prometer menos e entregar mais
Hoje, quando penso no motivo de ter “largado” o marketing, vejo que foi, na verdade, uma escolha por um impacto mais duradouro. Por um tipo de influência menos performática e mais funcional.
Quis sair do lugar de quem promete mundos e fundos para entrar no lugar de quem garante clareza, facilidade e informação.
Sinto que parei de falar para o usuário e comecei a falar com ele. E, na minha perspectiva, era a bala de prata que faltava para eu retomar a paixão pelo que já faço há mais de 10 anos: conteúdo.
Está pensando em migrar do marketing para o UX Writing?
Me questionei muito sobre o que estava fazendo, se deveria continuar, quais portas estava abrindo — ou pior, fechando. E alguns dos questionamentos eram:
1. Vou deixar de escrever de forma criativa?
Nem sempre. Criatividade continua sendo essencial, mas aplicada a resolver problemas de compreensão e fricção. A criatividade agora serve à funcionalidade.
2. UX Writing é mais técnico do que marketing?
Sim. Você terá que aprender sobre testes A/B, design systems, heurísticas de usabilidade, métricas de sucesso, acessibilidade, arquitetura de informação. Mas nada que um bom comunicador não consiga aprender com curiosidade e treino.
3. Onde estão as oportunidades?
Principalmente na indústria tech. Startups, scale-ups, grandes empresas digitais, fintechs, healthtechs e e-commerces. O mercado europeu e norte-americano têm vagas frequentes, mas a América Latina está crescendo e as coisas mestão mudando
4. Qual a maior vantagem da mudança?
Trabalhar mais próximo do produto, influenciar decisões estratégicas, ver o impacto direto da sua escrita na experiência de uso.
5. E a maior desvantagem?
Seu trabalho muitas vezes será invisível. Se tudo funciona bem, ninguém percebe. Se algo falha, aí sim o texto vira assunto. O ego precisa descansar.
6. Preciso de formação específica?
Não necessariamente. Muitos profissionais vêm do jornalismo, publicidade (eu mesma), literatura, design, psicologia. Mas estudar UX, usabilidade, acessibilidade e conteúdo estratégico, de preferência com quem já passou por isso e vive os desafios da disciplina diariamente, é necessário.
7. Dá para voltar ao marketing depois?
Sim. E com vantagem: você passa a entender melhor o produto, a linguagem da experiência e a jornada real do usuário, algo que enriquece qualquer estratégia de marketing de produto.
Mas posso ser sincera? Nunca vi isso acontecer… E não que o marketing seja “pior”, longe disso. Mas migrar para UX Writing não é só mudar o tipo de conteúdo. É mudar o foco, o impacto, o ego.
E se você se conecta diretamente com isso, dificilmente se acomodará e não buscará novos caminhos, áreas para explorar, formas de se comunicar. É uma nova forma de se expressar, e fica difícil voltar para um campo com outras necessidades e perspectivas.
Se você tem sede por relevância e acredita que o conteúdo é um elo entre intenção e ação , vai ser o caminho mais transformador da sua carreira.
Ao menos, para mim, foi.
Se esse texto te tocou, compartilha comigo: você também sente esse chamado? Já fez essa transição? Está em dúvida? Vamos conversar.
Por que larguei o marketing para apostar no UX Writing was originally published in UX Collective 🇧🇷 on Medium, where people are continuing the conversation by highlighting and responding to this story.